Cratinho de Açúcar virou terra da fumaça tóxica

Lixão sufoca vizinhos; ninguém acredita mais que haja solução, nem mesmo divina

Enfrentar 40 graus já é uma luta inglória. E parece ser o que nos resta diante do aquecimento global inquestionável e da compulsão humana em derrubar árvores e destruir ecossistemas. Agora, imagine fazer isso respirando fumaça tóxica. Todo dia.

É a vida, se é que se pode chamar assim, de moradores do sítio Lagoinha, vila São Francisco, conjunto Madre Feitosa e outras comunidades próximas ao lixão do Crato, no Cariri. 

O Crato, o município onde nasci (no extinto hospital São Miguel, hoje estampando nome francês), aquele que os moradores um dia já disseram ser a terra da cultura, que tem o apelido adocicado em referência ao brejo coberto de cana para produção de açúcar e cachaça ou ao doce de buriti, fruto da palmeira em risco de extinção. Sim, esse mesmo Crato está com parte mergulhada na fumaça.

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O incêndio no lixão completou uma semana neste sábado (18). A prefeitura afirma que está tentando resolver o problema com carro-pipa, caçambas e trator, abafando a fumaça. Foi registrado um boletim de ocorrência para que se investigue a causa das chamas. Há também um projeto para aterro sanitário consorciado do qual faz parte o município. É a longo prazo, daqueles que poucos enxergam.

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Porém, sinceramente, ninguém acredita mais que haja solução, nem mesmo divina. Esta semana, até o pároco do distrito de Ponta da Serra pedia ajuda em nome dos moradores. O território da paróquia de São José Operário é o mais atingido pela fumaça. Padre Paulo Lemos deixou Santana do Cariri tendo feito um trabalho excelente para a beatificação da Menina Benigna. Mal sabia ele qual era o martírio dos seus próximos paroquianos.

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É uma situação de várias gestões e não resolvida. Em outubro do ano passado, escrevi sobre isso neste mesmo espaço. Em momentos como esse, há sempre mais gente que reclame da crítica do que se esforce para dar fim ao problema. Só que há coisas na vida que silêncio algum resolve. Só piora.

A comunidade tem pressa e nada resta de paciência. Virou fumaça, com licença do trocadilho. O lixão do Crato é como a questão do esgotamento sanitário. Assim como os canos ficam enterrados, os lixões são postos nos confins do município, lá onde as gentes são mais simples e vivem da nobre atividade de plantar para alimentar os terráqueos presos no concreto da cidade. Aí ninguém lembra. 

Ou só lembrará ano que vem, quando visitaremos as cabines de votação. Já quem vive perto do lixo até faz força para esquecer, mas como consegue se nem respirar é fácil?