Afinal, quem não quiser tomar vacina pode ou não ser demitido?

Decisão recente do STF é mais um elemento da discussão jurídica

Legenda: A presidente do Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Ceará (Cosems-CE), Sayonara Cidade, observa que grande parte das pessoas que estão sendo contaminadas e desenvolvendo formas graves da Covid atualmente não tomaram a vacina ou não completaram as duas doses
Foto: José Leomar

De um lado, uma portaria do Ministério do Trabalho, de 1º de novembro, proibindo demissão por justa causa de empregados quando recusarem a vacinação contra Covid-19. A justificativa do ministério seria de que a demissão nestes moldes é discriminatória.

De outro lado, em sentido contrário, alguns artigos da CLT, pareceres do Ministério Público do Trabalho, decisões da Justiça do Trabalho, do Supremo Tribunal Federal (STF) (suspendendo a portaria) e até mesmo do próprio Ministério do Trabalho — que desde o ano passado define Covid como doença ocupacional a ser coibida pelos empresários e empregados.

Quem está certo?

Abaixo, tento responder a questão.

Obrigação do empregador e do empregado

A Consolidação das Leis do Trabalho, numa redação que existe desde 1977, informa que cabe às empresas instruir os empregados, através de ordens de serviço, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais (art. 157, II, CLT).

Ora, já na redação de 1977 cabia aos empregados observar as normas de segurança e medicina do trabalho, inclusive as precauções com doenças ocupacionais (art. 158, I), constituindo ato faltoso do empregado a recusa injustificada (158, parágrafo único, a).

Pelos artigos citados acima, nenhuma dúvida de que o empregado pode ser demitido se não se vacina sem justificativa razoável.

Mas e a Constituição Federal?

Como já falado nesta coluna alhures, o Direito à Liberdade - inepta e nauseantemente alegado por negacionistas - não se sobrepõe ao

1. Direito à Vida — o mais importante de todos;

2. ao Direito à Liberdade de outras pessoas;

3. e deve ser ponderado junto ao Direito ao Meio Ambiente do trabalho, que são Princípios que também estão na Constituição Federal.

A afirmação acima é óbvia e elementar em Direito, uma vez que, admitida a liberdade com ilimitada, nenhuma lei poderia existir, uma vez que o conteúdo da norma jurídica traz, em si, um comando que subtrai, na exata medida enunciada, a liberdade plena.

Veja também

Especialistas corroboram decisão do STF

Para a advogada e mestre em Direito Cinthia Maia (UNI7), “o meio ambiente saudável é um direito-dever constitucional de todo cidadão, como bem exposto no art. 225, ou seja, tanto tem-se o direito a um meio ambiente preservado, como também o dever de preservá-lo".

"Em relação à Covid-19, não poderia ser diferente, os empregados e empregadores têm o direito e o dever de preservar o ambiente onde trabalham, o que pode ser feito por meio da utilização de Equipamentos de Proteção Individual, treinamentos específicos e até mesmo da exigência da vacinação”, completa a advogada.

Perguntada sobre demissão por justa causa do empregado que recusa vacina, a professora ressalva que “a liminar do Ministro Barroso autoriza que não se vacinem pessoas com expressa contraindicação médica à vacinação, devendo essas pessoas fazerem testagens periódicas”.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.